MAGIC PUZZLE 1

*** SELECTED WORKS ***

Friday, September 15, 2006

FORMAS DO MUNDO

1-2

NÃO TÊM PESO AS PALAVRAS

Ferreira/Tavira, 15/9/1960

Não têm peso as palavras
nos teus lábios
não sei onde ouvi a tua voz
talvez dentro de mim
talvez na minha voz

Não são as formas do mundo
ásperas corroídas
nem o seu fundo mais fundo
de tristeza
não são as tuas cores
cores definidas
ou que a natureza reproduz
de deus ou do inferno as inventaste
e são apenas Luz

Há naves sulcando o intérmino corredor
há aves agoirando o amor
mas permaneces tu dando um sentido
segues contornando as faces
amaciando os ângulos
dando às plantas um perfume menos ácido
apareces ignorante da penumbra
abrindo com gestos o sol
és tu apenas movimento
no teu espaço de luz
no teu chão que se pode beijar

és tu apenas movimento
a ponte de silêncio
o sal do instinto
o bem e o mal

Pétalas líquidas
lágrimas de neve sobre a terra
tão poucas as palavras verdadeiras
tão belos os teus olhos
tão cegas e minazes as toupeiras

Se é certo que partiste
hei-de perder de certo os teus contornos
hei-de esquecer os traços do teu rosto
hei-de esmagar nos dedos o gelo da distância

Maiores vão ser os dias onde caiba
teu rosto claro de deus ou de criança.
+
eenergia> jogos do idioma - quadros didácticos para pendurar na parede - fichas de ecologia humana - 877 caracteres -eenergia> grelhas> inventar> ficcoes> texto aberto>

O QUE É QUE ESTÁ ERRADO NESTA LISTA?

Arcos, 15/9/1991

A (velocidade) da luz é energia
A amizade é energia
A arte é energia
A árvore é energia
A entropia é energia
A esperança é energia
A gravidade é energia
A poluição é energia
A rádio é energia
A revolução é energia
A ternura é energia
A via láctea é energia
A vida é energia
A voz é energia
As teorias sobre a energia são energia
Deus é energia
Einstein é energia
Hawking é energia
O biogás é energia
O céu é energia
O entusiasmo é energia
O espaço é energia
O mar é energia
O medo é energia
O nada é energia
O pássaro em cima da árvore é energia
O pensamento é energia
O ruído é energia
O ser humano é energia
O sexo é energia
O sistema solar é energia
O sol é energia
O stress é energia
O tempo é energia
O universo é energia
Os planetas são energia
+
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FOLHEANDO OS DIAS

Ferreira do Alentejo/Tavira, 15/9/1960

Não têm peso as palavras
nos teus lábios
não sei onde ouvi a tua voz
talvez dentro de mim
talvez na minha voz

Não são as formas do mundo
ásperas corroídas
nem o seu fundo mais fundo
de tristeza
não são as tuas cores
cores definidas
ou que a natureza reproduz
de deus ou do inferno as inventaste
e são apenas Luz

Há naves sulcando o intérmino corredor
há aves agoirando o amor
mas permaneces tu dando um sentido
segues contornando as faces
amaciando os ângulos
dando às plantas um perfume menos ácido
apareces ignorante da penumbra
abrindo com gestos o sol
és tu apenas movimento
no teu espaço de luz
no teu chão que se pode beijar

és tu apenas movimento
a ponte de silêncio
o sal do instinto
o bem e o mal

Pétalas líquidas
lágrimas de neve sobre a terra
tão poucas as palavras verdadeiras
tão belos os teus olhos
tão cegas e minazes as toupeiras
Se é certo que partiste
hei-de perder de certo os teus contornos
hei-de esquecer os traços do teu rosto
hei-de esmagar nos dedos o gelo da distância
Maiores vão ser os dias onde caiba
teu rosto claro de deus ou de criança
+

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Ferreira, 15/Setembro/1960

Não são as formas do mundo
ásperas corroídas
nem o seu fundo mais fundo
de tristeza
não são as tuas cores
cores definidas
ou que a natureza reproduz
de deus ou do inferno as inventaste
e são apenas luz
+
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NÃO SEI ONDE OUVI A TUA VOZ

Ferreira do Alentejo, 15/9/1960

Não sei onde ouvi a tua voz
talvez dentro de mim
talvez na minha voz

Não são as formas do mundo
ásperas corroídas
nem o seu fundo mais fundo
de tristeza
não são as tuas cores
cores definidas
ou que a natureza reproduz
de deus ou do inferno as inventaste
e são apenas luz

Apareces ignorante na penumbra
abrindo com gestos o sol
*
És movimento
apenas movimento
a ponte do silêncio
o sal do instinto
o bem e o mal

Tão raras as palavras verdadeiras
tão belos os teus olhos
tão cegas e minazes as toupeiras

Se é certo que partiste
hei-de perder de certo os teus contornos
esquecer os traços do teu rosto
esmagar nos dedos o gelo da distância
maiores vão ser os dias onde caibam
teus gestos calmos
de deus ou de criança.
+
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Lisboa, Janeiro de 1957

DISCURSO DE UM VENCIDO (= DESPEITADO) A TODOS OS VENCEDORES, DE ONTEM, HOJE E AMNHÃ, DE AQUÉM E ALÉM MAR

A vós, os argonautas
a vós, os exploradores do Antárctico, da Estratosfera e do Átomo
a vós, os descobridores dos caminhos marítimos
a vós, os donos, os prósperos, salutares donos, do Mundo, donos da Vida, donos das fábricas, de pontes, de hotéis, de esplanadas
a vós, os conquistadores, do México, da Índia, do Peru, da Moçarábia, do Tibete, da Palestina, de Timor Leste
a vós, conquistadores de mulheres, conquistadores do Céu e dos Mares
a vós, os que sois Luz
a vós, os Iluminados
a vós, os Heróis, do Dia, da História, dos Romances, heróis da Rua, do Pedal, do Volante
a vós, heróis do mar
a vós, os possuidores de tantos milhares de quilómetros de propriedade horizontal
a vós, os legisladores, os de cima, os da honra, os do bem, os do uso próprio
a vós, os fornecedores, os úteis, os inspirados, os imprescindíveis, os intocáveis
a vós, os magos
a vós, os santos, os puros, os deuses de aquém e além Olimpo, de «aquém e além Dor» ( Florbela Espanca dixit)
a vós, os precursores reconhecidos como precursores, profetas e premonitórios
a vós, os irmãos dos precursores, os vindos depois dos precursores
a vós, os inventores de cometas, mitos a atrocidades
a vós, os premiados, os eleitos e elegidos, os crentes e poderosos
a vós, os bons, os mansos, os justos, os do Evangelho, os de boa fé, os de boa fama, os de boa honra, os de boa marca
a vós, os domadores de feras, da fúria, dos oceanos, capitães, generais, chefes, chefes de bandos, de bandas, de exércitos, homens de posição
a vós, os delegados e directores gerais dos deuses, os lugares-tenentes dos deuses, os impedidos dos deuses
a vós, os que me não canso de admirar, até ao impudor, até ao êxtase, até ao desvairamento e à cegueira, ao instinto e á raiva
a vós, os descobridores de jazigos, filões, poços
a vós, os senhores do êxito, da Fama, do Sucesso, do Dinheiro, do Amor, do Fausto, das luzes
a vós, senhores de mim, gata borralheira, servo, mendigo, leproso, imundo cão de guarda dos vossos palácios, esterco dos vossos jardins
a vós, os reis, príncipes, duques, barões, os de sangue nobre, os de raça, timbre, estirpe e anel com brazão, elevador, electricidade e gaz canalisado
a vós, os emigradores
a vós, os novelistas, os plásticos, os triunfadores das bienais, da ciência, dos circos de Roma, das Olimpíadas internacionais
a vós, os dos focos em incidência perene, os presidentes, os das aberturas, os das fechaduras, os das inaugurações, os dos iates, os dos camelos no deserto, os dos estupefacientes inimagináveis, os que não sofreis torturando vítimas até à morte
a vós, os depositários do ideal, dos segredos de Estado das religiões de Estado e das religiões de Igreja, das chaves quando quero entrar em casa e me esqueci delas lá dentro
a vós, os intima, orgulhosa, abarcadoramente poderosos, subtis, sem retrocesso e sem erro, a quem só resta apenas engrossar a bola de neve, mais e mais e mais
a vós, os com ascendência e descendência, antepassados, primos Albuquerques, Gamas, Aguiares & Maias e Cabrais
a vós, os de um só rosto e uma só fé
a vós, os que de tão ilustres embaciais a Luz
a vós, os legadores e ususpadores de heranças, competidores sem rival à altura, batoteiros de cada lance a mil contos (em 1957 eu escrevi 100 contos)
a vós, os não ignorantes nem ignorados, com nome, fotografia e discurso nos jornais
a vós, os felizes por constituição, hereditariedade e vício
a vós, os que vos servis de todos os benefícios da civilização deitando os malefícios pela janela da carruagem, sem que pegue fogo ao restolho seco e sem fim e para sempre ceifado
a vós, os titulares, os onorariamente dispendiosos
a vós, os do botão dos cataclismos siderais, os do impossível, os das escaladas, os mortos na honra e na luta e na glória e na celebridade
a vós, os poetas não retóricos, não pletóricos nem platónicos
a vós, os algozes, os capatazes
a vós, os prestidigitadores, de qualquer modo solenes, de qualquer maneira capazes, sensíveis e argutos
a vós, os que gozam, os que exploram, os que produzem, os que consomem, os que não guincham, os que usam, os que abusam, os da caridade de tabernáculo, os que sentem em dia as digestões, a lei da consciência e da coincidência dos astros obtêm frutos sazonados num Verão que prometem, encomendam e recebem a domicílio
a vós, os capazes, os realizadores, os dinâmicos, os de uma compleição hercúlea de ponte entre Nova Iorque e Brooklin
a vós, os náufragos salvos pelo navio de carreira, os calculadores, os calculistas, os mediadores de esperanças a domicílio, os medianeiros do Céu, os dos metropolitanos das grandes capitais do Mundo
a vós, os abnegados, os salva-vidas, os imutáveis, os consoladores dos aflitos porque deles será o reino dos céus, os Lázaros, os do princípio, os de antes de antes de antes do princípio
a vós, os praticantes de ski nas montanhas da Suiça, os sultões, os ditadores de Estado, da Moda, da Lei e de trazer por casa
a vós, os audazes, os Édipo, os Camões, os Marco Polo, os nomes da História, nomes de texto, nomes dos livros, nomes das montras, nomes dos cartazes, nomes, bons nomes, nomes que custam fortunas, nomes das ruas e das praças, nomes de mármore com colunas
a vós, os que sois a explicação plausível do Movimento
a vós, os comandantes de dinastias, os violadores de virgens impunes, os iniciadores de mágicas negras
a vós, os que odiais e porque odiais sois mais que homens, na morte lenta entre as formas

a vós, os que venero sem dissimulação, entre quatro paredes, à espreita, apático, espionando a selva, não sublime, menos que artista e quase tanto como Verme
a vós, os que sois e mais do que sois vos vejo, mitificados no halo da Imortalidade
é a vós que estudo e informo
é por vós que atravesso os meus corredores de insónia, os meus pesadelos
é a vós que endereço os meus mais lúcidos pensamentos, sem absoluto, sem absinto, mas vigorosos como ao começar do princípio
a vós, os de nenhuma anormalidade, os não, nunca, jamais paralíticos, os não, nunca, jamais assimétricos, os não, nunca, jamais artríticos, os não, nunca, jamais perversos e pervertidos, nem segregados, nem assinalados, nem almejados, nem de má-sorte, má-vida, mau-humor, má-fama, má-fortuna
a vós, os mortos com sepultura, os com sepultura arquitectónica bastante acima da média, os mortos imortais, os mortos das academias, os mortos das escolas, os mortos dos cemitérios
a vós, os de farda, os de uniforme, os distintos e distinguidos
a vós, os não torpes, os sempre verticais, os sempre vivos, sempre fixes, sempre em pé
a vós, os audaciosos, os caracteres impolutos, os capitães da raça
a vós, os executores, os juizes, os mártires, os célebres, os críticos de poesia, os industriais, os nunca algemados, os nunca submissos, os nunca altru-ístas, os nunca sacrificados

A vós, o alvoroço das primeiras horas da manhã
a vós, os direitos do cidadão, as faixas de rodagem, a segurança nos caminhoa de ferro, a sinalização aérea
a vós, a morte medicamentada
a vós, os soros, a indústria, os cabeçalhos dos jornais
a vós, as calamidades telúricas

A vós, quero prestar tributo do meu desejo: morar sempre por baixo, no rés-do-chão, ser recinto de escarros e ofensas e humilhações, centro de gravidade de todos os pontapés, não claudicar nunca no heroísmo, nem na perfeição, não usar perfumes, nem ideais, nem me distinguir em nada, ser raso, igual, substantivo comum, não ter nome, nem exigências, nem ambições, nem programa, nem responsabilidades, nem diplomas, nem nenhuma espécie de importância, nem dinheiro, nem necessidade de dinheiro, nem nada
Não pertencer nunca à dinastia dos vencedores
+

Wednesday, September 13, 2006

AINDA QUE

57-09-13-VA> - versos seleccionados

TÊM OS OSSOS

13/Setembro/57

Têm os ossos, os dentes (os que não doem, os outros ficam, a doer), a paciência, a honra, na rua, a fingir dignidade - têm tudo isso. Cilindrem.
Não falo no plural, resigno-me ao singular. Vão. Autoclismem o que resta. Eu fico, nunca viajei por mar e é possível que nauseie e incomode os passageiros. Vão. Vão e boa viagem. Deixem o cilindro. Cilindrem.

Foi numa rua onde os carros andam só para cima (ou só para baixo?). 0 carro levou para a oficina uma pequena amolgadura. Muitas pessoas que viram. Um carro, um desastre, uma notícia, um morto. Mais de mil leram a noticia. Uma notícia de jornal é para mais de mil lerem. Um só é que morreu. O carro foi para o hospital-oficina, o morto para o cemitério. Mas muitos leram a notícia.
Como irá isto ser quando houver mais de mil mortos para um só leitor?

Na diluição das cores, na ausência de verdes, nos plúmbeos esbatidos é que vemos quantos pintores fracassados pelas paredes dessas igrejas: Assim como nós, poetas fracassados, quando um dia amarelecerem as folhas manuscritas...
Ah! Não furem nunca os olhos de uma pintura de autor e século desconhecidos!

Em S. Pedro de Alcântara - Rémiges comandando o voo, quilha fendendo o ar, ágil planador, um pombo não simboliza nada. Um pombo é um pombo. Se alguém se lembra de trazer-lhe o almoço de milho alvo (um pombo detesta glícidos) quer é comer. Multiplica-se num bando. Enche o jardim. Enchem o papo. Voam direitinhos ao céu, outros bebericam no lago.
Invejo-te, pombo branco que me olhas desse canteiro, o papo que se alimenta conforme Deus quer e as crianças se lembram de trazer um almoço de painço roubado lá da mercearia.

Nesta bola de terra com centro de gravidade que um escaravelho transporta, há quem deponha fé como o cigarro semi-ardido no cinzeiro. Pouco falta para chegar ao fim: o cigarro e a fé.
Escaravelho ruge. Escaravelho dorme, cumpre, assina o ponto. Escaravelho sobe, escaravelho tem que descer. Escaravelho copula até idade provecta. Escaravelho morre, enterra-se, apodrece. Escaravelho acabou-se.
E a bola de merda a girar no espaço.

Não esmoreçam, há o que há. No fundo já mas que não finde: uma réstia de sol, sangue, raiva, esperma ou uma fibra de carne tenra. O que resta deixem-no secar. Respiram o ainda possível. Talvez crie bacilos e amanhã, em vez de um resto, uma sombra, um átomo, sejam milhares.
Mas não o bebam ainda. Ainda que a sede vos doa e endoideça.
***

Tuesday, September 12, 2006

O VERBO É DEUS

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INDEFINIÇÃO

Faro, 12/9/1955

E os poetas cantam o mar
cantam o número de ondas que há no mar
perdem-se na conta e voltam atrás
sempre aos primórdios

porque no princípio era o Verbo
e o Verbo são eles
e o Verbo é Deus.

(In «Espaço Mortal», pg.12)
***