MAGIC PUZZLE 1

*** SELECTED WORKS ***

Saturday, June 17, 2006

SE É DE VIDA QUE FALAMOS

1-1 quarta-feira, 8 de Janeiro de 2003 - 2176 bytes -1969-ii>

SINAIS NO ASFALTO

Lisboa, 17/6/1969
No solo
mais propriamente na rua
não são pegadas
mas o sinal
o lugar ainda quente
das mãos
o que assinala a vida.
Se é de vida que falamos
e não de carburadores
de um lado ao outro lado da rua
e não de motores velocipédicos
de um e outro lado do mundo
e não de antros milimétricos
com seus pequenos monstros analfabetos
com seus impulsos de segundo (a prazo)
com suas amígdalas e amizades
suprimidas
com suas grandes rotas que não deixam sulco.
Se é de vida que falamos
deixo de habitar a fome em que normalmente habito
deixo fugir da liberdade que geralmente não tenho
o pássaro branco
e sob o fino manto em que estudo o mundo
de breves alucinações e de características vozes
traço o rumo.
Se é de vida que falamos
é o homem na sua solidão essencial
o que vejo no solo
mais propriamente na rua
de que falo
quer a água suba ao seu nível próprio
quer não
e as pegadas das mãos
ainda quentes
fiquem no asfalto.
+
1-2 quarta-feira, 8 de Janeiro de 2003-novo word - 2304 bytes -1969-IV>

NADA MELHOR

Lisboa, 17/6/1969

Nada melhor do que as estatísticas
ó humanos de ferozes dentes
para curar complexos
e na página da D. Aurora
nada melhor
para combinar casamentos.

Nomes santos nas ruas
as modalidades em voga
de inversão
desde as ardilosas manicuras
aos graxas de grande agilidade

nada melhor do que as estatísticas
para quem está no parque
a ver de cima a cidade.

Para adornar aos portos de mar
para fazer as pazes com o Mal
e para socorrer do celibato os incautos rapazes
que nada temem porque já nada esperam
além das fezes

nada melhor do que as estatísticas.

Por doces razões de perpetuar o navio
que construímos dentro da cidade
com o Adamov no prato
e um canto longínquo de toupeiras
ainda vivazes

nada melhor do que as estatísticas
para nos safar do abismo.

Se o frio não resulta
e uma solidão de altos fornos ainda menos

Se o berço por sinal
só por acaso é branco
e tem já algumas nódoas suspeitas

Se só quando se é cínico de verdade
nos aceitam

Então nada melhor e mais barato
do que as estatísticas
a trezentos por cento.
+
63-06-17-va> versos inéditos de ac - 3712 bytes -junº-17>

MULHER, PRECISA-SE

Beja, 17/6/1963

[Reabilitação do real quotidiano segundo o método automático da colagem]


Para conseguir cabeleiras que ainda é o mais barato
para não dizer fácil para dizer fácil
surdos batem os cascos de cavalo
não há dúvida que batem

Vem a propósito o que se conta desse homem
foi ontem exactamente à hora marcada para a inauguração

E batem levemente como quem chama a lírica
a mestra invenção
do Fogo na pré-história que já lá se encontrava antes da inauguração

Cascos batem na tua cabeça na calçada como se fossem astros perdidos
Batem na rua deserta
antes da inauguração

Era a véspera de amanhã
prevista para a inauguração
exactamente à hora marcada

A face matutina do costume escondia várias cabeças
de corte incerto
e atrás da nuca podia ler-se

MULHER PRECISA-SE

Qualquer serve
desde que tenha as medidas regulamentares
e mãos capazes em bom estado de conservação
Dos sentimentos esperam-se os mais eficazes
Contrato estado novo bom uso


Quem nos dera a nós um casco novo
um casco verdadeiro e ainda por cima veloz
o sacana foi irresponsável e não disse nada
disse cavalo
que é como quem diz
foi-se a milhares de quilómetros
pirou-se
e no fundo do jornal da tarde lia-se:
MULHER PRECISA-SE
Se possível com casa de banho e alguns bens
guarda-se sigilo
assunto sério
resposta ao número 15.020

Foi-se
Nem mais uma palavra
Foice

Agora estou muito melhor
digam lá o que disserem mas estou muito melhor
A paz é um coito de Vermes

De quem é a Voz ou qualquer serve?

MULHER PRECISA-SE

Urgente pago bem mesmo destelhada
para habitação temporária um pouco de passagem
um pouco de tudo o que estiver à mão
Dois palmos de joelho
onde o nível das águas começa a subir
e mais nada: contrato assinado

O gaiato não fosse a perseguição de que foi vítima
e já estaria longe
onde ninguém lhe deite as unhas

Telefonaram era de prever
por engano ou logo a seguir
tinha acabado de sair neste momento
Um momento por favor não desligue
telefonaram por engano
Desculpe com licença

MULHER PRECISA-SE
***

Monday, June 12, 2006

QUE FIZERAM DE TI?

63-06-15-va> - versos inéditos de afonso cautela – revisão em 2001-12-05 - 2048 bytes - junhº-15>

IMPESSOAL

Beja, 15/6/1963

Que fizeram de ti
automática morte
quase verde
inerme temporal
folha de vento
azul pensamento
lentamente mais tarde?

Que fizeram de ti
reflexo de sol
ervas de vidro transparente
núbil operário crucificado?

Que fizeram de ti
de tão sanguíneo lago
de tanta e tão calma
ocultação dos bichos
morte natural?

Que fizeram de ti
que disseram de ti
quem te cantou
a raiva de viver
sem amor
a raiva de aqui estar?

Que fizeram de ti
inerme cadáver sem raiz
folha quase verde
noite que ainda agora adormeceu
ao acordar?

Que fizeram de ti
sinal do tédio
brusca cicatriz
marca do mal
gemido?

Que fizeram de ti
algema
manhã
berço
animal?

Que fizeram de ti
Que fizeram de nós?

+
63-06-15- va> - versos de afonso cautela – 1963 – revisão em 2001-12-05 - junº>

CARTA A UM SUICIDA FRACASSADO

Faro, 15/6/1963

Lá porque te dói o corpo todo
não vais com certeza protestar
e mais o que o corpo os olhos
de não chorar
lá porque te doem os olhos
e é cada vez uma chatice maior
isto de aqui estar
e não há dúvida
não há saída
não há ninguém
não vais com certeza protestar
abandonar-te a essa mania
tão semelhante à morte
de te suicidar
ele há melhores formas de acabar

Matar não é legal nem solução
só o enjoo de puxar o gatilho
ou o nó de acaso queres a corda
outra chatice que nem vale o dinheiro
e quando lá chegavas estava tudo cheio
com o barco a apitar
a lotação esgotada
e já não era a primeira vez
além de que chovia
merda
mas enfim é lá contigo
experimenta e diz-me qualquer coisa do efeito
pode ser à entrada de um café
muita gente à saída
já se sabe
na rua já se sabe também muita gente
a mesma igual e agitada porcaria
talvez o tom de azeitona madura
resulta
ou a cor de Cobalto
te fique melhor

Os amigos
ah é verdade os amigos
que ideia pois é os amigos às vezes
os amigos nem sempre
o certo é que tu não ias chatiar
mas os amigos naturalmente
já estavam chatiados
e não há nada a fazer

Aqui para nós
que ninguém nos ouve
ouve-me bem e acata meus conselhos
tu até podes ser muito feliz e casar
já não é o primeiro que ganhou bastante
e foi por igreja
falou-se muito do copo de água nos dias seguintes
mas tão rapidamente quanto as pernas to permitam
e a úlcera
faz o que podes
todos fazem o que podem
ir à praia ao domingo por exemplo
na condição de regressares à tarde no comboio da noite
e podes mesmo sonhar se acaso ainda não perdeste
aquele aparelho de sonhar que te deram
se perdeste manda fazer outro
criador de sonhos
parecido com uma máquina de moer café fora de uso
se acaso já perdeste - ia eu dizendo -
a capacidade de fazer sonhos à mão

Tens razão tudo isto
é um verde vómito pelo esófago acima
uma grandessíssima merda ia eu a dizer desculpa
mais forte do que nós
mas por isso mesmo é que dá vontade
de andar aos pontapés com alguém
amar alguém
o que custa é não estar aqui
é estar com uma perna para cada lado
e no lugar da cabeça
um tornado
olha
aconselho-te a dormir
dias meses seguidos
depois é igual mas ficas melhor
e mais leve
enquanto dura a semi-claridade do sono
depois é outra vez
noite
e nunca se sabe
porque à noite todos os gatos costumam ser pardos

O resto é niilismo pois claro
esta luz que fere como um vidro
ou uma lâmina
e os dedos como se fossem pétalas
a desprender-se um por um
ou as mãos a cair uma por uma
ou as células
a desfazer-se
esta amargura esta lenta e fina amargura
tão semelhante às gredas dos Açores e afinal
quem se admira

Tem paciência já agora aguenta já te disse
meia bola e fé em deus
avança pró rectângulo e não ligues aos apupos da Canalha
isto de dormir não dá sempre resultado
e pode haver recaídas
acorda uma pessoa se é que acorda com uma grande dor do lado
do coração que é o lado das grandes dores o cabrão
ou então pachorrento procura no cemitério logo de manhã
procura como os cães procuram remexendo nos caixotes
procura por toda a parte no interstício das lousas
não partes as unhas
a grande verdade
é só fazer qualquer coisa por desespero
e não esqueças que o melhor é não ser valente
muitos se armaram e já lá estão pra sempre
experimenta uma vez por ano
uma vez em cada século podes ser o Escolhido
podes ser o que Encontra e só a ti acontece
experimenta anda até tarde
talvez as pedras falem talvez as bocas se abram
quem sabe se para te beijar
se conseguires não desconfiar
e quem sabe
quem sabe
quem sabe

Estás crescendo e és jovem
em ti não houve esperança mas és jovem
há tantos anos jovem
que vais ficando velho
mas insiste procura mastiga ensaliva bem e pode ser
que apareça no meio de uma grande estepe Azul
inundada de Sol
o Cavaleiro da Rosa em seu corcel
ou uma estrada um sinal uma lembrança
que leve ao castelo medieval

Se te pergunteram para que serves
responde que és um bocado de Sol que se extraviou do Pai
um resto de Ternura que te ficou de pequeno
Mas vai
Hoje é para te dizer apenas
que encontrei a fórmula serena
que abri a porta aberta ao Deserto
e que não te quero convencer de Nada
mais do que estou perto
Descobri que a morte é uma forma disfarçada
de existir
e não estou disposto à farsa
e a vida
essa é a mais alta forma de colaboração com o Inimigo
a mais velha Corte da Europa em Ruínas
a cair de velha e a pedir guilhotina há muitos anos

Queriam pegar-me de lado - imagina - mas raspei-me
pelo sítio mais fundo - o das Ostras - da enseada breve
por isso vim aqui e te chamei
porque estou hoje humaníssimo
e até se vê de fora
porque tive um radioso encontro com a mágica mandala dos universos sucessivos
e no fundo da gaveta fui encontrar
um deserto de penas multicores - é só ligar
e um corpo sensível devorado de gritos
ou de répteis

Como deves calcular fiquei satisfeitíssimo
com estas metáforas
que não me custam nada e (deves concordar) são felizes

Além disso
descobri o Crime perfeito
que dispensa carros de aluguer e motos de corrida
que mata sem lágrimas
sem vestígios
sem dor
sem sangue

uma espécie de Cianeto mas muito moderno
talvez o Veneno mais potente da terra
mas que só tem o Defeito de não ser completamente mortal
+
1-3 - 63-06-15-va> scan domingo, 17 de Novembro de 2002

Beja, 15 de Junho 1963

e não vais protestar rapazinho
lá porque te dói
o corpo todo de uma ponta a outra
e mais do que o corpo
os olhos sabes lá porque te doem os olhos mas sabes
isto é cada vez uma chatice maior e não há dúvida
não há saída ou saída há mas ninguém sabe e todos ficam a olhar

é por isso rapazinho não vale a pena abandonar a pele
essa tua obcecada mania tão semelhante a um aerólito
tão semelhante
matar-te não é legal mas que bom e além disso também não é solução
só o enjoo de pensar nisso e ter que dar ao gatilho
ou o nó a corda se acaso escolheste a corda
merda aliás é outra
chatice que nem vale o dinheiro e quanto lá chegavas
era muito capaz de estar aquilo tudo cheio a lotação esgotada
conforme a hora quando se chega e já não era a primeira vez
mas talvez experimenta entre gritos é lá contigo pode ser
à entrada de um café já se sabe muita gente à saída
já se sabe na rua já se sabe a mesma igual irresoluta
porcaria

Água espessa entre o cinzento e a cor de azeitona verde
cobalto quase os amigos pois é os amigos às vezes
fazem jeito às vezes é claro que não venho chatiar
mas é claro às vezes já estavam chatiados e não há nada a fazer
pois é os amigos mas só às vezes sempre também aborrece
é mesmo uma chatice às vezes até maior tu que o digas maior
chatice do que aqui estar

ia dizendo uma água espessa de cor indefinida
os amigos já de si muito ocupados ainda capazes de desejarem felicidades
também não se pode ser muito exigente amigo
aqui para nós até podes ser muito feliz e casar já não é o primeiro
que ganhou bastante e foi por igreja do copo de água falou-se muito
não tão rapidamente quanto as pernas to permitem cada um faz o que
pode
isso é lá contigo e continuas em cima podes mesmo ir à praia ao
domingo na condição de regressares à tarde no comboio da noite
e podes sonhar se ainda não perdeste o aparelho
se perdeste mandas
fazer outro criado de sonhos
assim parecido com uma máquina de fazer café
se acaso não perdeste ia eu dizendo a capacidade de fazer sonhos
tens razão é um grandessíssimo vómito a subir do baixo ventre
pelo esófago acima até à boca
uma grandesíssima merda ia eu a dizer mais forte do que nós
mas por isso mesmo é que dá vontade de amar uma vontade raivosa
de amar
dá vontade de andar aos pontapés eu sei
custa o que custa não é estar aqui é estar com uma perna para
cada lado e no lugar da cabeça
um tornado

Não é poder deixar de estar
para conselho estou por aqui e aconselho-te o melhor
palavra de honra é dormir e dorme
depois é igual mas ficas mais leve é só enquanto dura aquela
semi-claridade do sono
isso é que é bom de apreciar principalmente num jovem

o resto é niilismo não concordas? da cabeça ainda menos
a quererem saltar os miolos com muita força quase a rebentar
doer-te-ão menos parece que o caso foi comprovado por médicos
esta luz que os fere é claro falava dos olhos que os fere
como vidros mas prefiro a imagem da lâmina a fazer golpezinhos
nas pálpebras e depois arrancar com os dedos uma por uma
um por um os bocadinhos ora se sangrar é o menos sangrar a direito

esta amargura esta lenta fina tortura muito semelhante
à lâmina amigo tem paciência
já agora já te disse isto de dormir de lado não dá sempre
resultado acorda uma pessoa com uma grande dor do lado do
coração agonia lenta não percebo vou chamar agora é que
te vou chamar
procura no cemitério logo de manhã pode ser que encontres
talvez encontres por toda a parte a grande mentira a mentira
mais pequena
só fazer qualquer coisa por desespero não

é contigo falta-te o melhor coragem para ser valente o
melhor é não ser valente experimenta um vez
por ano
em cada século podes ser o escolhido lentamente a justiça
entre tantos que procuram a mesma coisa só a ti aconteceu
procura anda até tarde talvez as pedras falem as bocas
para te falar e quem sabe para te beijar e quem sabe

e quem sabe procura procura sempre até tarde
as paredes que só costumam ter ouvidos tenham nesse dia bocas
para te falar e quem sabe para te beijar alguém procura
à tua espera alguém para te beijar é verdade
que estás crescendo que está crescendo em ti não houve
esperança foi coisa que por já ires ficando procura é verdade
estás crescendo dou-te razão existindo há tantos anos é caso
para ires ficando um pouco farto pode ser que apareça
no meio de uma grande estepe igual à de onde estás inundada de sol
falta uma estrada um sentido um caminho
procura falta procura falta procura falta um sentido uma estrada procura
estar aqui já tu sabes que é estar aqui se te perguntarem
para que serves diz que já tens servido se te interrogarem
para onde vais diz que fazes que já tens feito e que és de facto
um resto
de sol um resto da planície rapazinho um resto
obediente inundado de sol vai procura vê
vê se aguentas vê se aguentas

A FAZER HORAS

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POR AQUI A FAZER HORAS

[Tavira, 13/6/1963]

Por aqui a fazer horas
a fazer pela vida
vai ali um cão pela trela
chateado e a criança
que de criança não tem nada
ao lado.
*
Por aqui a tirar mortos dos autênticos
cada um do seu saco
que mais parecem
mares interiores do que ninguém

Do fundo de um poço de um mar de um saco
a tirar a verdade como quem tira um dente
por aqui não anda ninguém
e é tarde.
*
Mais isto amor
um texto antigo
tão antigo
nem te conheço não
não te conheço

Uma sirene veloz
pela cidade dentro
a única suspensa
um livro na distância
com a capa cinzenta
a tua voz
a para ti para ninguém
falta-me o rosto
o teu rosto
falta-me a esperança
a tua esperança

De onde vieste amor
Porque vieste?
*
A morte é duas vezes menos eficaz
do que esta sombra encostada
do que esta água
a solidão parada
abre certeiramente e corre

Por aqui por ali mais adiante
o tirano compra e alguém se vende.
+
1-1 quinta-feira, 9 de Janeiro de 2003 - 63-06-13-cd>

MAIS UM TEXTO ANTIGO

13-Junho-1963

Mais um texto antigo
E tão antigo que te não conheço

Mais uma sirene veloz pela cidade fora
Que o medo fica ao pé de nós

Mais a certeza de ser eu esse livro
Ou na distância essa capa cinzenta

Mais aqui mais ali um eficaz detergente
Afinal amor de onde vieste?

RELÓGIO DE SAL



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SER A META DE SANGUE

Tavira, 12/6/1961

Ser a meta de sangue
a meio da estrada
e falar
no mais oculto canto subterrâneo
falar aos surdos
desta pátria
de solidão.
+
1-1 - quarta-feira, 8 de Janeiro de 2003-scan - 61-06-12-vp>

SE EM VEZ DE ESCREVER

[Publicado em «Caderno Alfa – Poesia 1» - Coimbra, Fevereiro de 1964]

Tavira, 12-Junho-1961

Se em vez de escrever
Dormisse
Se do tecto descessem
Em vez de aranhas
Cordas
Se no côncavo das horas
Em vez de te encontrar
Te matasse
Era para ti
O que restar de mim
E nunca existiu
Chamas para te inventar
Na ponta de uma lança
Amor
Ponto cardial do tempo
Onde incomensurável
Cresces
E o mar
É só a tua ausência
Que ficou

A roda sem fim
Sem meio
E sem princípio
Do infinito.
+
61-06-12-vs> -2304 bytes - junº-12>

RELÓGIO DE SAL

Faro, 12/6/1961
I
pés de sol
em chão verde
chão
pés de mesa
em vão
de onda
ou escada
pés de múmia
na pele
na água
na sombra
hoje ontem amanhã
canção incompleta
II
Um rato seco
pedra sobre pedra
apenas o rastro
o dado no telhado
o cisco
o lápis do cabelo
seco
a nora
finge a magra esfinge
seca do seu osso
que roeu seco
e duro pouco
o flanco
a raiz das palavras
o símbolo da água
um veio atmosférico nos peixes
de respiração sanguínea
seca
declives de amoras
entre parêntesis
um rato
um rapto
pedra sobre pedra
um rato
seco
Ramo seco
em ponto morto
a flauta
de aflitas sedes
de crianças fulvas
de jardins suspensos
de sonoras sedes
água de ignorância
que nunca mais invente
que nunca mais se lembre
que se radique
que mova e dissolva
seco monólogo
diálogo
seco